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Prolactina e Infertilidade

A Prolactina é um hormônio proteico, produzido e secretado pela hipófise anterior, capaz de interferir em várias funções fisiológicas, sendo a principal delas estimular o desenvolvimento da glândula mamária e a indução e manutenção da lactação. Entretanto, a presença de receptores em diferentes tecidos incluindo várias regiões do cérebro, ossos, tecido adiposo, intestino, pele, sistema imunológico e trato reprodutivo, sugere uma atuação sistêmica, muitas delas ainda não completamente conhecidas. No ovário, receptores de prolactina se expressam na granulosa, células intersticiais e luteais. Estão presentes ainda no endométrio, miométrio e decídua. O estradiol é o principal estimulante ovariano na secreção de prolactina. Age na hipófise estimulando a expressão do gene da prolactina e no hipotálamo modulando a atividade dos neurônios prolactina responsivos.

 

A secreção de prolactina é regulada especialmente pelos neurônios tuberoinfundibulares, localizados no núcleo arqueado do hipotálamo, com ação inibitória tônica exercida através da liberação de dopamina no sistema porta hipofisário que, por ativação predominantemente dos receptores D2 dos lactotrófos, inibe a expressão do gene e a secreção de prolactina. Assim, a prolactina se mantém em níveis séricos basais a maior parte do tempo e se eleva em algumas condições fisiológicas como na gestação, amamentação, estímulo mamilar, exercício físico e em situações de estresse psicológico.

 

As causas mais frequentes de hiperprolactinemia são tumores hipofisários ou efeito farmacológico de drogas que interagem com o sistema dopaminérgico. Em mulheres, 90% dos prolactinomas são tumores intraselares pequenos, com pouco potencial de crescimento. Já os homens apresentam macroadenomas em sua maioria.

 

Na prática clínica a hiperprolactinemia é responsável por 20 a 25% das amenorreias secundárias, sejam elas fisiológicas, farmacológicas ou patológicas. Em situações não fisiológicas, constitui uma causa frequente de disfunção reprodutiva, podendo levar á infertilidade tanto em homens como em mulheres. Embora a hiperprolactinemia seja uma causa conhecida de hipogonadismo hipogonadotrófico e infertilidade anovulatória, o mecanismo pelo qual a prolactina inibe a secreção hipotalâmica de GnRH ainda não é completamente conhecido. Nos últimos anos, alguns estudos demonstraram que a prolactina pode modular o eixo reprodutivo através de ação num tipo específico de neurônios hipotalâmicos, que expressam o gene Kiss1(2,4). Estes genes expressam receptores para prolactina e codificam neuropeptídios conhecidos como kisspeptinas, que são poderosos ativadores da liberação de GnRH(1). Existem evidencias de que tanto a prolactina interfere na expressão dos neurônios kiss-1, quanto de que a kisspeptina controla a secreção de prolactina(3). Experimentos em roedores evidenciam que a capacidade da kisspeptina induzir a secreção de prolactina está diretamente relacionada com os níveis de estrogênio circulante(8). Na presença de estrogênio, a kisspeptina aumenta a secreção de prolactina através da inibição dos neurônios dopaminérgicos tuberoinfundibulares, sugerindo que a expressão dos neurônios Kiss-1 faz parte do mecanismo de feedback responsável pela modulação da secreção de prolactina (6).

 

Modelos experimentais com ratos hiperprolactinemicos demonstraram reduzida imuno reatividade da kisspeptina-1 tanto no núcleo arqueado, quanto no núcleo anteroventral periventricular. Estes ratos não ovulam, apresentam baixos níveis de gonadotrofinas e expressão reduzida do gen Kiss-1. Neste modelo, a Injeção intraperitoneal de kisspeptina-1 restaurou tanto a secreção de GnRH, quanto de LH e FSH, restabelecendo a ciclicidade, mesmo sem diminuir os níveis de prolactina sérica(7). Em mulheres hiperprolactinêmicas, em amenorreia hipogonadotrófica, a administração endovenosa de kisspeptina (Kp-10) reativou a secreção de gonadotrofinas e aumentou a atividade ovariana. A elevação de gonadotrofinas se acompanhou de um aumento de estradiol e inibina B a níveis compatíveis com a fase folicular do ciclo menstrual em mulheres saudáveis(5). Estes experimentos sugerem que a inibição do GnRH determinada pela hiperprolactinemia ocorre, ao menos em parte, pela diminuição da secreção de kisspeptina-1. É possível que a administração de Kp-10 ou análogos da mesma venham a ser uma opção terapêutica viável para indução da ovulação em pacientes com hiperprolactinemia, intolerantes ou não responsivas aos agonistas dopaminérgicos ou ainda, em mulheres que não podem dispensar o uso de neurolépticos/antipsicóticos e que deseja gestar. A utilização de Kp-10 no tratamento da infertilidade em pacientes hiperprolactinêmicas tem despertado o interesse de vários pesquisadores e se mostrado uma opção terapêutica promissora, especialmente nos casos em que a utilização de agonista dopaminérgico não restabelece a ovulação.

 

 

Elaine Sangalli Mallmann
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Referências:

1. Bernard V, Young J, Chanson P, Binart N. New insights in prolactin: pathological implications. Nat Rev Endocrinol. 11(5):265-75 (2015).

2. Brown, R., Herbison, A. & Grattan, D. Prolactin regulation of kisspeptin neurons in the mouse brain and its role in the lactation-induced suppression of kisspeptin expression. J. Neuroendocrinol. 26, 898–908 (2014).

3. Donato J Jr, Frazão R. Interactions between prolactin and kisspeptin to control reproduction. Arch Endocrinol Metab. Nov-Dec;60(6):587-595 (2016).

4. Kokay, I. C., Petersen, S. L. & Grattan, D. R. Identification of prolactin-sensitive GABA and kisspeptin neurons in regions of the rat hypothalamus involved in the control of fertility. Endocrinology 152, 526–535 (2011).

5. Millar RP, Sonigo C, Anderson RA, George J, Maione L, Brailly-Tabard S, Chanson P, Binart N, Young J. Hypothalamic-Pituitary-Ovarian Axis Reactivation by Kisspeptin-10 in Hyperprolactinemic Women With Chronic Amenorrhea. J Endocr Soc. Oct 16;1(11):1362-1371 (2017).

6. Ribeiro AB, Leite CM, Kalil B, Franci CR, Anselmo-Franci JA, Szawka RE. Kisspeptin regulates tuberoinfundibular dopaminergic neurones and prolactin secretion in an oestradiol-dependent manner in male and female rats. J Neuroendocrinol 27(2):88-99 (2015).

7. Sonigo, C. et al. Hyperprolactinemia-induced ovarian acyclicity is reversed by kisspeptin administration. J. Clin. Invest. 122, 3791–3795 (2012).

8. Szawka RE, Ribeiro AB, Leite CM, Helena CV, Franci CR, Anderson GM, et al. Kisspeptin regulates prolactin release through hypothalamic dopaminergic neurons. Endocrinology 151(7):3247-57 (2010).

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